Arteônica

Português

A Computer Art poderia ser considerada como a realização de um processo de objetivação de idéias por imagens, abrangendo variáveis psicológicas, éticas, sensoriais, ideológicas, sensíveis, intelectivas, etc., mediante operações aritméticas e lógicas. A meta é a síntese entre os cálculos e a lógica do compilador e a experimentação global da Arte. As fases explícitas na computer art são as da análise e a da programação. A análise, no entanto pressupõe a existência de um problema e o problema a de um objetivo.

É ao nível do que chamamos de objetivo que corre a maior complexidade ainda inexplicada, que de resto não é específica da cumputer art mas constante da Arte. Com ou sem razões o artista assume uma estratégia geral, suficientemente poderosa e adequadamente eficiente com relação à objetivação para permitir a realização das fases seguintes: a análise e a programação.

Ao nível da análise morfológica o problema perde temporariamente sua conexão imediata com as finalidades mais amplas e históricas, dando início a um outro estágio de desenvolvimento criativo, que compatibiliza o desejável e com o preferível no âmbito de alternativas colocadas pelo processo técnico. A escolha e o uso de instrumentos matemáticos é uma aplicação que permite a codificação do problema: comunicar-se com a máquina. É nessa fase que a máquina vem adquirindo superioridade, na medida em que as regras-do-jogo a favorecem com relação ao usuário, sujeito a influências as mais diversificadas e dispersivas. Esses segmentos do processo podem ser conhecidos com uma precisão e uma objetividade nunca antes alcançadas.

É por essa razão provavelmente que os temas mais frequentes nos debates entre técnicos se desenvolvem em torno das últimas fases do processo artístico e, diversamente, com os leigos as discussões se desenrolam no âmbito dos objetivos mais amplos. Antigamente na economia manufatureira e artesanal a fase conhecida da comunicação por imagens era a da execução do objeto. A seguir, na revolução industrial, conheceu-se a fase da programação.

Na Idade Paleocibernética estamos apreendendo os sentidos da análise numérica da imagem. É utopia imaginar-se que futuramente o próprio objetivo poderá ser equacionado por um processo consciente? Neste momento porém toda tentativa de enfocar somente a extensão do que se conhece do processo de criação artística – a análise e a programação – como único campo admissível de consideração, corresponderia a uma visão incompleta e estreita.

English

Computer art may be seen as a process of objectifying ideas through images, approaching psychological, ethical, sensory, ideological, sensitive, intellective variables etc. through arithmetic and logical operations. The aim is to synthesize the compiler’s calculations and logic with the global experimentation of art.

The explicit stages in computer art are analysis and programming. However, analysis presupposes the existence of a problem, which in turn presupposes an aim or objective. It is at the level of what we call ‘objective’ that there is the greatest complexity, as yet unexplained, which is in any case not specific to computer art, but a constant of art. Rightly or wrongly, artists assume a general strategy that is powerful and efficacious enough in relation to objectification to enable the subsequent stages of analysis and programming.

On the level of morphological analysis, the problem temporarily loses its immediate connection to broader and more historical purposes, starting a different stage of creative development that reconciles desirable with preferable in the context of alternatives posed by the technical process. Selecting and using mathematical instruments is an application for encoding the problem of communicating with machines. In this stage, machines have acquired superiority, to the extent that the rules of the game favor them over users, who are subject to a wide range of distracting influences.

These process segments may be more accurately and objectively examined than ever. Therefore, the most frequent themes in discussions among specialists may well develop around the later stages of the artistic process. Unlike discussions among non-artists, they will thus develop in the context of broader objectives. Formerly, in the manufacturing and handicraft economy, the wellknown stage of communication through images was that of executing objects.

Then the industrial revolution brought the period of programming. In the Paleo-cybernetic Age, we are learning the meanings of numerical analysis of the image. Would it be utopian to imagine that the objective itself may be formulated by a conscious process in the future? At the moment though, only an incomplete and narrow view would attempt to focus the extent of what is known about the process of artistic creation – analysis and programming – as the only admissible field for consideration.

Português

O USO CRIATIVO DE MEIOS ELETRÔNICOS NAS ARTES

as variáveis da crise da arte contemporânea são a inadequação dos

meios de comunicação, enquanto transporte de informações, e a ineficácia da informação enquanto linguagem, pensamento e ação. embora o uso das palavras comunicação e informação na literatura científica não assuma significado unívoco, entendemos por comunicação o transporte, processamento e mecanismo técnico utilizados para a transmissão e armazenamento da informação. destarte, tanto o objeto artesanal quadro como a máquina que reproduz ou complementa algumas funções do sistema nervoso, do cérebro ou do comportamento humano na atividade artística, reproduzindo- -as mediante um órgão artificial, integram sistemas de comunicação.

a obsolescência do sistema de comunicação da arte tradicional reside na limitação de consumo implícita na natureza do meio de transmissão. o número limitado de fruidores possíveis, os custos elevados, a área de atendimento e as dificuldades técnicas do sistema de comunicação da arte tradicional estão aquém da demanda cultural quantitativa e qualitativa da sociedade moderna. as obras tradicionais são objetos físicos a serem apresentados em locais fisicamente determinados, pressupondo o deslocamento físico dos fruidores. numa cidade como são paulo, de oito milhões de indivíduos, cujas projeções populacionais para 1990 prevêem uma cifra de mais de dezoito milhões de habitantes, esses meios de comunicação não são viáveis.

e ainda menos o serão para uma cultura em níveis nacional e internacional, básicos para o desenvolvimento harmônico da humanidade. essas evidências simples não parecem ter sido suficientemente compreendidas. artistas de formação basicamente tradicional pensam em resolver a crise comunicativa saindo das galerias e indo para a micropaisagem urbana ou para a macropaisagem regional, embrulhando montanhas por exemplo.

parecem não ter percebido que o obsoleto está na natureza da coisa e não na sua escala. de fato a arte tradicional é mais conhecida mediante a reprodução pelos meios mecânicos e eletrônicos do que através da fruição direta. essa tradução (ou comutação) comunicativa implica, porém, em perda de informação do ponto de vista da mensagem pretendida na origem. a recíproca é verdadeira: a tradução para a tela de mensagens da comunicação de massa (pop) não escapa do mesmo destino de degradação do nível informativo. a conversão digital da imagem analógica mediante a retícula ou o rct da tv pode alterar substancialmente a estrutura gestaltiana da mensagem. a obra que implicitamente define o espaço físico do seu próprio consumo setoriza o ambiente, pressupondo uma zona específica para a fruição artística. por outro lado, a crise de informação da arte contemporânea deriva de uma problemática artística que é a continuação da tradição, perpetuando a alienação que resulta do desenvolvimento linear do processo artístico. essa é também uma setorização, agora não apenas física mas também semântica, na medida em que o consumo da obra de arte requer um conhecimento prévio de repertórios exclusivos. a setorização comunicativa / informativa conflita com o caráter interdisciplinar e aberto da cultura planetária.

a utilização de meios eletrônicos pode proporcionar uma solução para os problemas comunicativos da arte mediante a utilização das telecomunicações e dos recursos eletrônicos, que requerem, para a otimização informativa, determinados processamentos da imagem. no caso da arteônica o transporte não causa transformação. a utilização dos novos meios comunicativos pouco significaria, no entanto, se não levasse em conta as mais diversas variáveis da cultura. aumentando o número de fruidores a situação da cultura se torna mais diversificada e o feed-back mais complexo. na medida em que a compreensão das condições gerais esteja à base de todo esforço criativo, o ato de criar vem exigir métodos mais complexos e meios mais eficazes. nesse rumo é que a arte poderá reencontrar as condições para o desempenho da sua função histórica. sabe-se que a mera utilização do computador não significa por si só a solução de todos os problemas.

nota-se por exemplo uma tendência para o virtuosismo técnico, visando a uma demonstração hedonística sofisticada. essa tendência, embora não formule problemas novos no campo da arte, em virtude dos processos automáticos empregados, possui o grande mérito de desmistificar a arte tradicional e contribuir para a análise de processos da mente na atividade artística. se os problemas artísticos puderem ser tratados por máquinas, ou por equipes que incluam o “partner” – computador –, poderemos saber mais a respeito de como o homem trata os problemas artísticos. a simulação reproduz com eficácia e rapidez a produção artística tradicional, exaurindo-a, esvaziando-a, fornecendo a certidão de óbito do misoneísmo.

essa tendência, embora lance mão de recursos vastos, se autolimita à setorização já por nós apontada a respeito do diagnóstico das possibilidades comunicativas da arte tradicional, embora nessa condição setorial promova inegavelmente uma operação iconoclasta altamente higiênica. o problema mais urgente não é, contudo, o de rivalizar com a arte tradicional, porquanto isso equivaleria a aceitar um campo de atuação já condenado à absolescência definitiva. uma segunda tendência da arte eletrônica visa a realizar obras interdisciplinares, aproveitando pesquisas e descobertas no campo da neurologia e da psicologia (gestalt), processando nesse sentido imagens com a ajuda do computador. tipicamente sintática, essa tendência se inscreve na

faixa da arte concreta desenvolvida nas condições históricas da primeira revolução industrial (suprematismo, neoplasticismo, construtivismo etc.), que criou uma linguagem de máquina para a comunicação da sociedade urbana e industrial. a esse respeito podemos destacar as semelhanças evidentes entre a arte concreta e a computer art.

o fato de que as tendências sintáticas tenham sofrido no decorrer da década 60/70 uma profunda crise, deu-se em virtude principalmente do aparecimento de uma nova cultura popular de massa, possibilitada pelos meios eletrônicos de comunicação (que se refletiu de diferentes maneiras no campo da arte, particularmente através de endereços conservadores – como o pop, o novo-realismo e a nova-figuração). a nova cultura popular tornou-se responsável pela introdução no problema arte de novas variáveis que transcendem as impostações meramente sintáticas. deve-se salientar, contudo, a importância, no domínio da conscientização das atividades humanas, do desenvolvimento da pesquisa sintática, elevada dos meios mecânicos para os eletrônicos.

por fim, extraordinária significação assume para a cultura a utilização do computador no domínio da imagem com finalidades exclusivamente técnicas e científicas, notadamente no campo da leitura, reconhecimento e interpretação automáticas de “patterns”, proporcionando recursos imensos não apenas para a programação criativa como para a programação de estudos críticos das mensagens artísticas. no brasil a computer art iniciada em 1968 encontra antecedentes metodológicos na arte concreta, que apareceu no fim da década de 40 e teve seu maior desenvolvimento, atingindo o apogeu, na década 50/60. a arte concreta foi no brasil a única que utilizou métodos digitais para a criação. coincidindo com o período que apresentou o maior índice de industrialização, a arte concreta no brasil forneceu algoritmos largamente utilizados para comunicação através de meios industriais de produção.

a arte concreta visual influiu decisivamente sobre a vanguarda na poesia, na música e na programação visual. na visão prospectiva da importância dos meios eletrônicos para a cultura nacional deve ser salientada a variável da extensão territorial. para os campos da atividade sócio-econômica, o sistema de telecomunicação, atualmente em processo de expansão, constitui um fator de relacionamento, aproximação e integração. essa mesma macroinfraestrutura da comunicação poderia oferecer os meios para o desenvolvimento de uma cultura artística de âmbitos nacional e internacional. a cultura enfrentou no passado dificuldades físicas provenientes de uma ocupação do território nacional por núcleos de diferentes dimensões, separados por distâncias de milhares de quilômetros, áreas essas com densidades populacionais baixíssimas, às vezes praticamente vazias. por outro lado, no interior desses núcleos, a proximidade excessiva chega a degradar as condições de vida, comprometendo as possibilidades comunicativas. os recursos eletrônicos de comunicação poderiam corrigir essas duas anomalias, permitindo um melhor equilíbrio ecológico entre o fato físico e o comunicativo..

English

THE CREATIVE USE OF ELECTRONIC MEDIA IN THE ARTS

The crisis of contemporary art is a consequence of two variables: the inadequacy of the means of communications to transmit information and the inefficiency of the information they carry in regard to language, thought and action.

Although no univocal meaning is ascribed to the words communication and information in the scientific literature, we understand by communication the transmission and processing of information as well as the technical mechanism employed in transmitting and storing it. Thus, communication systems comprise both the craft of painting and the machine that reproduces or complements some functions of the nervous system, the brain or the human behavior in the creation of artworks, reproducing them through an artificial organ.

The obsolescence of the traditional communication system of art resides in the limited consumption implicit in the nature of the transmission medium. Due to the limited number of possible viewers, the high costs, the geographic limitations and the technical difficulties, the traditional communication system of art fails to live up to the qualitative and quantitative cultural demands of modern society.

Traditional artworks are physical objects to be displayed in physically determined places, and they assume the physical displacement of the viewers. In a city like são paulo, with eight million inhabitants and whose projected population for 1990 exceeds eighteen million inhabitants, these communications media are not feasible. They will be even less feasible for culture at the national and international levels, which are essential for the harmonic development of mankind. These simple evidences do not seem to have been sufficiently understood.

Artists of primarily-traditional educational background think of addressing the communications crisis by stepping out the gallery space to move to the urban micro-landscape or the regional macro-landscape, where they wrap mountains, for example. These artists seem not to have realized that what is obsolete is not the scale, but the nature of the thing. In fact, the traditional art is best known through the reproduction of the mechanical and electronic media of communication than through direct fruition. This communicative translation (or commutation) implies, however, loss of information from the point of view of the message intended at the origin. The reverse is also true: the translation of messages from the mass media (pop) to the canvas does not escape the same degradation of information. The digital conversion of the analog image via screen or crt of tv can substantially alter the gestaltic structure of the message.

The artwork, which implicitly defines the physical space in which it is consumed, separates itself from the environment. It requires a specific zone for its artistic fruition. On the other hand, the informational crisis of contemporary art derives from an artistic problem that is the continuation of tradition, thus perpetuating the alienation resulting from the linear development of the artistic process. This is also a form of isolation, not only a physical isolation but a semantic one as well, inasmuch as the consumption of the artwork requires specific previous knowledge of exclusive repertoires. The communicative / informational isolation conflicts with the open and interdisciplinary character of world culture. The use of electronic media may lead to a solution to the communicational problems of art, since telecommunications and other electronic resources require, for their informational optimization, certain forms of image processing. In the case of arteônica, the transmission of information does not bring about a transformation.

The use of the new communication media would mean very little, though, if we do not take into account the many different variables of culture. When the number of viewers increases, the cultural situation becomes more diversified and the feedback becomes more complex. While the understanding of the general conditions provides grounds for every creative effort, the creative act requires more complex methods and more effective media. It is in this direction that art will find again the conditions to realize its historic function. It is clear that the mere employment of the computer does not mean by itself the solution to all problems. We can see, for example, a tendency towards technical virtuosity aimed at demonstrating sophisticated hedonism. This tendency, though not raising new artistic problems, has the great merit of demystifying traditional art and contributing to the analysis of mental processes in artistic practice in view of the automated processes employed. In case the artistic issues can be treated by machines or by teams including a “partner” – computer – we will learn more about how man handles artistic issues. Simulation efficiently and promptly duplicates the traditional art output, draining and exhausting it, thus providing a death certificate of misoneism.

This tendency, as much as it employs countless resources, is still limited to the isolation we pointed out above regarding the diagnosis of the communicative possibilities of traditional art, even though in this condition of isolation it undoubtedly promotes a highly-hygienic iconoclastic operation. The most urgent problem is not, however, a rivalry with traditional art, inasmuch as this would be equivalent to accepting a field of action that is definitely condemned to obsolescence.

A second tendency in electronic art aims at creating interdisciplinary works by taking advantage of scientific research and discoveries in neurology and psychology (Gestalt), processing images with the aid of a computer. Typically syntactical, this tendency falls within the range of concrete art developed in the historical conditions of the first industrial revolution (suprematism, neoplasticism, constructivism etc.), Which created a machine language for the urban and industrial society to communicate. In this sense, we can highlight the evident similarities between concrete art and computer art. The syntactical tendencies in art underwent a deep crisis in the 1960s and 1970s and this was especially due to the appearance of a new popular mass culture, made possible by electronic communications media (this phenomenon affected the art scene in different ways, particularly through conservative agendas – such as pop art, the new realism and the new figuration).

The new popular culture became responsible for introducing new variables in art that transcend merely syntax-based styles. Nevertheless, emphasis must be given to the importance – in the domain of cognizance of human activities – to develop a syntactic research shifting from mechanical media to electronic media. Finally, the use of the computer solely for technical and scientific purposes to treat images has had an amazing impact on culture. This is clear in reading, in automatic pattern recognition and interpretation, thus providing huge resources not only for creative programming but also for the programming of reviews of artistic messages.

In Brazil, the computer art introduced in 1968 is mirrored in concrete art, which appeared in the late 1940s and peaked in the 1950s and 1960s. Concrete art was the only art form in Brazil to utilize digital creative methods. Coinciding with the period of highest industrialization, concrete art in Brazil offered algorithms largely employed in communications via means of industrial production. Visual concrete art had a decisive influence over the avant-garde in the fields of poetry, music and visual programming. When foreseeing the future importance of electronic media to the Brazilian culture, the size of the country is a variable to be considered. For the fields of socioeconomic activity, the telecommunication system, currently being expanded, is a factor of relationship, rapprochement and integration.

This same communicative macro-infrastructure could offer the means for the development of an artistic culture of national and international reach. In the past, culture faced physical difficulties resulting from the settlement of the Brazilian territory by different-sized communities located thousands of kilometers apart. Some of these areas of extremely low population density were virtually uninhabited. On the other hand, within these communities, the population’s coexistence in excessively close proximity eventually degrades living conditions and jeopardizes potential communications. The electronic communication resources could fix these two anomalies and promote greater environmental balance between the physical and communicative facts..